segunda-feira, julho 17, 2006

À sombra da árvore

"Árvores dão flores, frutos, sombra. Árvores embalam sonhos – infantis ou não. Da pequena falsa-murta à figueira cinqüentenária, cada centímetro de tronco carrega uma lembrança. Aqui, exemplos de esculturas vivas"

Diferentemente dos projetos que costuma assinar, o desta casa no Alto de Pinheiros, em São Paulo, estava quase pronto. A vegetação foi sabiamente mantida pelo paisagista Raul Pereira pela exuberância e singularidade. 'Fiquei surpreso ao encontrar exemplares como uma falsa-murta adulta e uma esponja-de-ouro, árvore rara no Brasil e de crescimento lento, que está robusta', diz Pereira. Além de conservar um estilo típico da década de 70, o jardim carrega lembranças da infância do morador atual, que vive com a mulher e as filhas.

O paisagista retirou algumas espécies para que outras sobressaíssem. 'Tudo gira em torno da falsa-murta, centralizada em meio aos 252 m2 de jardim', afirma Pereira. As ramificações mais baixas foram podadas e dois bancos, dispostos em 'L', convidam à leitura e às brincadeiras embaixo da pequena árvore. Quando chega a primavera, as florzinhas brancas forram a copa e perfumam a área. 'O projeto tem a escala do olhar. Tudo é visível e palpável, para aproximar os moradores do jardim.'

Conservada na área, a falsa-murta (Murraya paniculata) virou o centro das atenções depois de ganhar banquinhos ao seu redor. Almofadas e lanterna, L'Oeil. Seixos rolados demarcam o espaço e contrastam com o verde do gramado e o branco da pedra São Tomé. Renques de helicônia, à esq., disfarçam parte do muro, que ganhou (ao lado da porta) lírios-da-paz-gigantes (Spathiphyllum ortgiesii) com forração de barba-de-serpente-branca

Castanheira para atrair esquilos

Plantas da região dominam os 2.600 m2 de terreno da casa de campo do paisagista Benedito Abbud, em São Roque, no interior paulista. No meio de cássias, xaxins, dracenas, cerejas-silvestres e paus-jacaré, chama a atenção a castanheira-portuguesa, não menos adaptada ao clima. Plantada na área da piscina, a árvore, ainda jovem, cresce vigorosamente e começa a dar frutos.

Quando a castanheira frutifica, as aparições de esquilos são assíduas. Vale esperar uma visita. Ao fundo, viburno (Viburnum sp)
Nenhuma planta foi retirada do lugar. A escada foi arquitetada prevendo o movimento das árvores nativas. Ao redor do tronco da cássia-amarela foram plantadas orquídeas-bambu

Única espécie não-nativa da região, ela conserva as melhores histórias. 'Há quatro anos vi esquilos ao redor de uma castanheira. A cena me levou à infância, à época em que as castanhas sempre apareciam nos jantares de Natal. Resolvi acrescentá-la à vegetação para atrair esquilos, mas também com saudosismo', revela Abbud. E os bichinhos realmente aparecem na hora da refeição.

A castanheira preenche a primeira seqüência de jardim. A metragem total do lote permitiu que fossem trabalhados conjuntos de vegetação, revelados gradativamente. Para esconder o 'jardim das carpas' - que fica abaixo do platô da piscina - os galhos inferiores da castanheira foram mantidos, criando uma cortina verde.

Cássia-amarela
Senna multijuga
Muito empregada em parques e jardins do Sudeste do país, esta árvore brasileira atinge até 10 m de altura. O longo florescimento, de dezembro a abril, torna-a extremamente ornamental. Pelo pequeno porte e forma estreita da copa, é boa para arborizar ruas

Castanha-portuguesa
Castanea sativa
O clima frio é a paixão desta árvore nativa da Europa, do norte da África e da China. Sua castanha cresce dentro de um ouriço, mas sai naturalmente quando amadurece. Pode atingir 25 m de altura. O tronco produz madeira dura utilizada com freqüência em construções

Orquídea-bambu
Arundina bambusifolia
Também conhecida como arundina, esta orquídea terrestre, originária de Burma, possui folhas laminares e alongadas, que podem atingir até 2 m de altura. Principalmente na primavera e no verão, dá flores bastante decorativas, em tons entre o branco e o lilás

Uma senhora figueira

Não foi difícil para a paisagista Sylvia Luz, do espaço Topiária Paisagismo, incorporar a figueira com mais de 50 anos e 7 m de altura ao projeto paisagístico desta casa no Jardim Paulista, em São Paulo. A árvore, tombada pelo Condephaat - Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo, foi mantida do projeto original e domesticada ao jardim de 306 m2. 'Podamos alguns galhos para diminuir a sombra e evitar que seus frutos e leite manchem o chão de tijolos', diz Sylvia. Essa operação acontece a cada dois anos.

Nos 120 m2 onde se acomoda o jardim da piscina, a castanheira (Castanea sativa), ao centro, reina absoluta. Com apenas quatro anos, o exemplar frutificou pela primeira vez em dezembro passado. À esq. dela fica a cássia-amarela (Senna multijuga), nativa da região: tem aproximadamente 15 anos e 10 m de altura

A pedido da moradora, a vegetação prima pela praticidade e resistência para suportar as brincadeiras dos três filhos pequenos e do labrador. O visual monocromático - só com flores brancas - garante o estilo. Espécies venenosas e com espinhos foram vetadas. A paisagista usou falsa-vinha para cobrir o muro e, junto dele, camélias e nandinas. Mesmo com bolas, skates e muita corrida, o jardim está sempre em ordem graças à boa escolha das espécies.

Camélia
Camellia japonica
A origem oriental - Japão, China e Coréia - em nada influenciou o comportamento deste arbusto, que se adaptou bem ao clima tropical. Cultivado a pleno sol ou à meia-sombra, atinge até 6 m de altura. Suas flores brancas são formadas no outono e no inverno

Figueira
Ficus auriculata
A folhas largas e ramificadas e a copa cheia desta árvore originária da Índia não deixam dúvida quanto à sua beleza. Quando adulta, atinge facilmente 7 m de altura. Seus frutos são avidamente consumidos por pássaros

COMO TRANSPLANTAR ÁRVORES

Preservar árvores de valor ornamental ou sentimental são apenas duas das justificativas para transplantar uma espécie, mas regras mudam de cidade para cidade. Ou seja, pensou em retirar uma árvore, ligue para a prefeitura para ver se pode. Em São Paulo, a lei 10.365, de 1987, determina que árvores são bens comuns dos munícipes. Qualquer transplante tem de ser comunicado à sub-prefeitura, que o autoriza apenas quando as plantas causam algum transtorno ao imóvel ou quando se quer construir no lugar. Ainda assim, outras árvores têm de ser plantadas como 'compensação'.

A operação de transplante exige muita técnica e pode se tornar cara, caso seja preciso maquinário para viabilizar a retirada, o transporte e o plantio. Embora todas as árvores possam ser retiradas, há tipos que oferecem dificuldade, como os de raiz pivotante (em forma de pião vertical): eucalipto, pinheiro e cedrinho, por exemplo.

A técnica mais eficiente, conhecida como sangramento, prepara a espécie para o transplante com até três meses de antecedência ao corte do pião (raiz principal). O diâmetro correto a ser cavado varia conforme a planta. A idéia é não prejudicar o torrão. Para isso, uma fórmula leva em consideração o DAP, Diâmetro da Árvore à Altura do Peito. Em média, toma-se como base a medida de 1,30 m de altura para medir o diâmetro do tronco. Com isso chega-se ao DAP. Seis vezes superior ao DAP será o diâmetro do torrão; oito vezes o DAP a sua profundidade.

Após cavar a vala ao redor do torrão, são colocadas folhas, serragens e matéria orgânica entre este e a terra, esperando o restabelecimento da espécie por três meses. Após o corte, deve-se embrulhar o pião em um saco de sisal e efetuar o transporte. Para não haver rejeição, vale marcar os galhos da árvore voltados para a face norte e plantá-la sob as mesmas condições em uma cova com o dobro do tamanho do torrão. Depois de preencher o espaço com matéria orgânica, mantê-la apoiada em paus ou cabos de aços por um ano. Após o plantio, deve receber regas diárias. Em geral, a melhor época para a operação é a primavera.


Fontes: Raul Pereira (paisagista) e Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo

A prioridade, aqui, era deixar o máximo de área livre para brincadeiras. Junto ao muro foram previstas cercas vivas de camélia, à frente, e, em seguida, nandina (Nandina domestica). A figueira, conservada do projeto original, dá volume e proporciona a melhor sombra do jardim. Os muros foram cobertos por falsa-vinha (Parthenocissus tricuspidata), que, com o tempo, esconderá totalmente a alvenaria


Fonte: Revista Casa e Jardim